23.7.15

Patrimônio e Cidade. Teresina. 2015

Entrevista concedida pela arquiteta Alcília Afonso (Kaki) à jornalista Marta Alencar da Revista Cidade Verde, no dia 23/07/2015.

1 - O que é necessário para que um patrimônio seja tombado e no que isto implica?
Inicialmente, esclareço que os bens patrimoniais podem ser tangíveis ou intangíveis. Os tangíveis, podem ser móveis ou imóveis. E dentro dessa classificação estão incluídos os bens naturais e construídos.
Para um bem ser tombado ele precisa ter um significado e um determinado valor para a memória coletiva de uma determinada população, comunidade, cidade, lugar.
O valor pode ser sentimental, histórico, cultural, arquitetônico, urbanístico, entre outros, e dependendo dessa valoração, o grau de preservação varia.

2 – A senhora tem algum levantamento e/ou estudo a respeito de imóveis tombados em Teresina que foram não foram preservados ou demolidos?
Em 2014, estávamos dando continuidade no GPE/SEMDUH a um inventário dos bens arquitetônicos de Teresina, que havia sido iniciado pelo arquiteto Olavo Pereira, anos atrás, e que havia ficado inacabado.Com a minha saída de Teresina, em abril de 2015,  esse trabalho continuou sendo realizado por um trabalho de extensão que montei, coordenado pelo arquiteto Victor Veríssimo do GPE, juntamente com alunos do curso de Arquitetura e urbanismo da Ufpi, supervisionados pela prof. Ana Rosa Negreiros. O material, portanto, encontra-se no GPE/SEMDUH. 

3 – Em Teresina, um grupo de estudantes de comunicação e arquitetura realizaram o Movimento Viva Madalena, com o intuito de manter preservado um imóvel localizado no centro que estava sendo desmoronado. A senhora acredita que movimentos como esses são importantes para a preservação da memória da cidade, já que a fiscalização do poder público é ineficiente?
Acredito que sim, é muito importante. Acompanhei via online o movimento Viva Madalena , e acionei colegas de profissão e luta pela preservação do patrimônio em Teresina, como Natan Portela, da OAB/PI,  Sanderland Ribeiro/CAU PI, Leide Sousa, Patrícia Mendes/Fundac, para colaborarem, orientando a luta dos alunos pela preservação da casa.
Fiquei emocionada em ver essa turma jovem, contribuindo para um trabalho que passei mais de 30 anos desenvolvendo na cidade, e muitas vezes, com pouquíssimo apoio da comunidade, que não possuía essa mobilização social.
Sabe-se das dificuldades da política na área de preservação cultural, a falta de equipe, de espaço, de legislação atualizada, e a vontade popular é fundamental para contribuir nos abusos praticados pelo poder econômico, que deseja passar por cima de todos, e de tudo,para implantar as suas propostas, desrespeitando todo um trabalho existente.

4 – A senhora tem conhecimento a respeito do mestre de obras que contribuiu para a construção da maior parte dos imóveis localizados no centro de Teresina? A senhora pode falar mais sobre a história dele.
Nunca ouvi falar desse "mestre de obras"...Isso é lenda! Não houve apenas um, mas vários pedreiros, vários mestres de obras, engenheiros, construtores, arquitetos que juntos, construíram a história arquitetônica do centro histórico de Teresina. A arquitetura e sua produção é complexa e interdisciplinar e em mais de 30 anos trabalhando nessa área, jamais ouvi referência a esse personagem que perguntas.

5 – Com relação a responsabilidade da preservação desses patrimônios. A senhora acredita que isso parte da Prefeitura de Teresina, órgãos de preservação, proprietários desses imóveis ou da sociedade como um todo?
O trabalho de preservação cultural é um processo, composto de várias etapas, nas quais os distintos atores devem agir juntos. A população solicita a preservação, o poder público estuda os casos, aplica as leis, e mais uma vez , poder público e sociedade civil organizada fiscalizam e correm atrás de propostas de revitalização, restauração, intervenções.
Nesse processo, é fundamental, o trabalho de educação patrimonial, sempre de forma constante e me todos os níveis e mídias.
Todos juntos, conseguem mais força para tentar mudar esse triste cenário cultural brasileiro de nossas cidades, que desprezam a história urbana e arquitetônica de nossos lugares.