31.10.10

O processo de preservação da Fábrica de Lacticínios das Fazendas Nacionais em Campinas do Piauí.


Esboço da Fachada principal da Fábrica de Lacticínios em Campinas do Piauí de autoria do estudante de arquitetura e urbanismo da UFPI, Roosevelt Cavalcanti. Grupo de pesquisa “Amigos do Patrimônio”, Fonte: AFONSO, A. MORAES, M.2009.

Este texto que se intitula “O processo de preservação da Fábrica de Lacticínios das Fazendas Nacionais em Campinas do Piauí” pretende abordar a questão da preservação do patrimônio industrial e rural piauiense, apresentando um conteúdo de forma original e inédita, em nível nacional e internacional.

Tem como objeto de estudo a Fábrica de Lacticínios , que está implantada no município de Campinas do Piauí, e que se encontra em estado precário de conservação, mas passa atualmente, por um processo de tentativas de restauração e revitalização.

Os dados aqui expostos e as análises realizadas são referentes a este importante estabelecimento industrial, localizado em área rural do interior do Estado do Piauí, que fazia parte do patrimônio das Fazendas Nacionais, e que foi inaugurado em 1897.

Através de pesquisas realizadas pelo grupo de pesquisa “Amigos do Patrimônio”, do curso de arquitetura e urbanismo da UFPI, coordenado pela professora Dra. Alcilia Afonso, cadastrado na UFPI/ Universidade Federal do Piauí, obteve-se acesso aos dados coletados para a elaboração deste texto que segue metodologia trabalhada pelo grupo.

A Fábrica de Lacticínios é um exemplar da relação entre o patrimônio rural e o industrial no Estado, e passa por um complexo processo para a sua preservação, conforme será demonstrado neste texto.

Trata-se de uma edificação de grande valor arquitetônico e histórico, e que demonstra a vanguarda dos atores envolvidos no planejamento e na implantação desta obra, no final do século XIX, em uma região totalmente desprovida de infra-estrutura naquela época.

O local no qual foi edificada a Fábrica de Lacticínios havia sido no passado, propriedade do sertanista Domingos Afonso Mafrense, que ao morrer, em 1711, deixou como doação para os padres jesuítas, sendo posteriormente, após a expulsão destes em 1760, repassadas para o patrimônio real, divididas nas inspeções de Nazaré (Floriano), Canindé (Campinas) e Piauí:

“Eram, ao todo, 17 fazendas, subdivididas em 24. Depois de terem passado pela administração de jesuítas, corte portuguesa e monarquia brasileira, essas terras ainda representavam o enorme latifúndio deixado por Mafrense e pela Casa da Torre, que, no Piauí, se estendia da foz do Canindé até o extremo sul da Província, em um prolongamento que chegou a corresponder a cerca de 140 léguas.” (IPHAN-PI, 2008, p.36)

O projeto arquitetônico da Fábrica é atribuído ao engenheiro alemão Alfred Modrack, que também foi autor do Teatro 4 de setembro, construído em Teresina. Em ambos os projetos, Modrack adotou o estilo neoclássico para resolver a volumetria. Na obra do Teatro, iniciada em 1890 e concluída em 1894 (AFONSO, 2002, p.36) projetou um edifício com uma composição plástica simétrica, empregando elementos da linguagem neoclássica como frontão, modenatura bem marcada, pilastras pouco salientes, simetria na distribuição das esquadrias em arco ogival.

Para o projeto da Fábrica, continuou empregando os mesmos critérios projetuais utilizados no Teatro, mas observam-se um maior rigor formal, mais simplicidade projetual e construtiva. Os projetos desenvolvidos por Modrack no Piauí ainda são pouco estudados e merecem investigações mais aprofundadas, pois há inclusive certas indefinições que comprovem a autoria de suas obras, conforme colocou SILVA FILHO (2007, volume 2, p.274), sobre o projeto do Teatro 4 de Setembro.

O engenheiro industrial Antonio José Sampaio foi o idealizador da obra e responsável pela construção da Fábrica. Graduado na Escola Politécnica Federal de Zurique, Sampaio possuía um sonho e planejou bem a sua concretização:

“Com um plano de racionalização do aproveitamento da área, Sampaio ainda se valeria de sua experiência e estudos na Europa para fundamentar seus intentos em relação às Fazendas Nacionais. As muitas informações deixadas por ele revelam que, não obstante se tratasse de um prédio isolado no meio do sertão piauiense, a construção da Fábrica de Laticínios foi fruto da avaliação das potencialidades econômicas da época e do espaço”. (IPHAN-PI, 2008, p.37)

O processo de revitalização da antiga Fábrica de lacticínios é um desejo de preservação da memória coletiva de uma sociedade, que reconhece nesta edificação o valor histórico e arquitetônico que a mesma possui na formação histórica, social e econômica do Estado do Piauí, denotando uma forte relação entre a arquitetura rural e a industrial da época estudada.

Idealizada por um arrojado engenheiro agrônomo de formação européia, que arriscou construir em pleno sertão piauiense, no século XIX, um grande edifício neoclássico para produzir leite e manteiga, e que mesmo com as dificuldades enfrentadas de transição política entre o regime monárquico e a República, conseguiu durante meio século, inserir o Piauí no cenário industrial nacional.

Após a realização deste texto, conclui-se também, que há ainda muitos vazios nesta “história”, e que se necessitam maiores esclarecimentos a respeito de fatos levantados, como por exemplo, um maior aprofundamento investigativo sobre as fazendas nacionais no Piauí, a atuação do engenheiro alemão Modrack no Estado, e o trabalho precursor de Antônio José Sampaio.

Certamente, as reflexões aqui realizadas poderão despertar interesses em pesquisas futuras sobre estes temas, devendo colaborar com o entendimento da formação cultural do Piauí, e suas contribuições para a produção arquitetônica brasileira.

Referências bibliográficas:

AFONSO, Alcilia; MORAES, Michele de. Arquitetura Piauiense. Teresina: Edufpi. 2009

AFONSO, Alcilia; Arquitetura em Teresina: 150 anos. Da origem à contemporaneidade. Teresina: Gráfica Halley. 2002

IPHAN- PI. Estabelecimentos das Fazendas Nacionais do Piauí. Dossiê de Tombamento. Volume 1. IPHAN. Superintendência do Piauí. Teresina: Abril de 2008.

SILVA FILHO, Olavo Pereira da. Carnaúba, pedra e barro na Capitania de São José do Piauhy. Belo Horizonte: Ed. do autor, 2007.